Ecologia Urbana

Blog da disciplina de ecologia urbana, do 5º ano da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, docência do Professor Doutor Jacinto Rodrigues

14.3.07

Artigo sobre construção em bambu no Courrier Internacional

“BAMBU PODE REVOLUCIONAR CONSTRUÇÃO
Resistente, económico e ecológico, o bambu volta à ribalta pela mão de arquitectos de todo o mundo. Do mais simples pavilhão ao estádio desportivo, as aplicações são surpreendentes.

Se disser que existe um material de construção 50 vezes mais resistente que o carvalho, e mais leve do que o aço e o betão, flexível, estético e ecológico, vai pensar que é bom demais para ser verdade. Se ainda acrescentar que se podem construir com ele não apenas pontes e catedrais mas também chão, paredes, fatos, papel, vinagre e cosméticos e alimentar homens e animais, vai dizer que estou a tomar os meus desejos por realidades. Contuso, esse material existe: é o bambu.

Por todo o mundo, arquitectos, decoradores, ONG e defensores do ambiente tornaram-se grandes adeptos desta planta de caule oco. Bambus gigantes, que crescem mais de 30 metros em altura e 25 centímetros de diâmetro, estão a ser cultivados para responder às novas necessidades da construção civil.
Na Colômbia, um país na vanguarda da arquitectura moderna em bambu, grandes talentos como Óscar Hidalgo López, Marcello Villegas e Simón Velez realizam casas sumptuosas e edifícios públicos em bambu. Nos estados Unidos, o arquitecto californiano Barrel DeBoer, especialista em construções com matérias-primas ecológicas, serviu-se dele para construir edifícios universitários e escreveu um manual sobre a sua utilização. A empresa Bamboo-Technologies, com se de no Havai, obteve a certificação do Governo norte-americano para a utilização de um determinado tipo de bambu para construção (Bambusa Stenostachya), com o qual edificou mais de 50 casas em todo o arquipélago na Califórnia, a mais cara das quais custou 250 mil dólares (194 mil euros). Espera construir mais este ano, noutras regiões temperadas dos Estados Unidos e da Europa, e o mais recente concurso lançado sobre este tema atraiu mais de 300 candidatos de 63 países.
DeBoer gaba “a robustez, a longevidade e a beleza” deste material que o lançaram como o novo menino-bonito dos arquitectos de interiores. Pode ser transformado em pranchas e divisórias, em armários de cozinha e móveis, tudo numa grande variedade de cores naturais. A empresa londrina Urban Living está entre os seis fornecedores britânicos de pavimentos em bambu. Diz vender “imenso”: “É um produto com uma relação qualidade –preço excepcional, tão sólido como o carvalho, mas com um custo muito inferior”, aponta o seu administrador, Adam Robertson. O preço de um soaalho em bambu é de 16,49 libras por m2 (25 euros), contra cerca de 40 libras (60 euros) para madeira proveniente de florestas de exploração sustentada.
Resiste a furacões e terramotos
Em Bali, Linda Garland, conhecida como “a rainha do bambu”, fabrica camas, sofás e outros móveis, com 200 espécies de bambu (das 1500 existentes) que produz na sua propriedade, próxima de Ubud. As criações de Linda são procuradas, entre outros, por David Bowie e Richard Branson, e está presentemente a construir no leste da ilha uma enorme casa de férias, com paredes e tecto em bambu negro, para o realizador Rob Cohen. Preconiza igualmente a utilização deste material para construir habitações sociais, com vista às catástrofes naturais, pois as edificações em bambu comportam-se melhor do que as outras estruturas peranre furacões e tremores de terra: testes realizados em 2004 pela Timber Research and Development Association, uma organização britânica, mostraram que resistem a sismos de magnitude cinco na Escala de Richter. Linda Garland insiste no aspecto ecológico do material. O rendimento de um bambual é quase 25 vezes superior ao de uma floresta. Podem obter-se entre 22 e 44 toneladas de bambu por hectare, por ano, e as colheitas têm lugar três a cinco anos após a plantação. Sendo uma gramínea, isto é, da família das ervas, novos rebentos de bambu aparecem espontaneamente quando se corta o anterior, pelo que nunca há necessidade de replantar. Os bambus impedem a erosão do solo, retêm pelo menos quatro vezes mais CO2 do que uma floresta de árvores jovens e produzam 35 por cento mais oxigénio.
O bambu, que serve de abrigo para o homem há milhares de anos, foi recuperado em 2000, quando Simón Velez construiu um pavilhão de 1830 metros quadrados com quatro mil bambus gigantes, para a exposição de Hanôver. O projecto foi-lhe confiado pela ONG Zero Emissions Research and Initiatives (ZERI), uma “rede mundial” que tem por objectivo construir uma sociedade “sem desperdícios”. O banbu utilizado para o pavilhão era suficientemente resistente para satisfazer as rigorosas regulamentações europeias em matéria de construção civil. Um peso de dez toneladas, colocado na ponta de um beirado com 7,5 metros de vão não provocou senão cinco centímetros de abaulamento, praticamente absorvido quando a carga foi retirada. Para DeBoer, a arquitectura em bembu foi revolucionada com o recurso a argamassas e cavilhas para a ensambladura, uma técnica desenvolvida por Velez há 20 anos.nas construções tradicionais, como as do sul do Pacífico, as canas de bambu são presas uma às outras com lianas ou outras fibras naturais, ligações que se fragilizam com o passar do tempo e por acção das intempéries. O método de Vélez consiste em preencher com argamassa uma parte das canas entre dois nós e a fixá-la com cavilhas. Podem, assim, agrupar-se várias canas, formando colunas dignas de uma catedral, ou travamentos com mais de 50 metros de comprimento. O mais recente projecto de Velez é uma residencial ecológica de 130 quartos, na China; mas já construiu estruturas muito mais “musculadas” na Colômbia, como sejam pontes por cima de gargantas no meio de montanhas, tectos de fábricas enormes, estádios e mercados cobertos.
Vantagens e inconvenientes
As florestas continuam a ser sobreexploradas e a cultura do bambu vai inevitavelmente tornar-se cada vez mais importante. “É uma planta que pode servir para imensas coisas”, declara Francesca Ambrosini, representante na Europa da International Network for Bamboo and Rattam (INBAR) (Rede Internacional de bambu e cana-da-índia), uma ONG financiada pelas Nações Unidas e pela União Europeia. Esta associação faz a promoção de produtos como o papel, os têxteis (tecidos extremamente sedosos, absorventes e antibacterianos) e cosméticos fabricados a partir do bambu, graças a técnicas desenvolvidas nos últimos anos. O próximo grande alvo é o sector da construção, em que a Europa se deixou atrasar bastante. A partir de modelos realizados por Velez para o VitraDesign Museum, na Alemanha, a INBAR trabalha na concepção de casas moduláveis de painéis de bambu, adaptadas aos climas europeus e que deverão custar 70 libras por metro quadrado (106 euros). As primeiras devem estar a fincionar no final deste ano. “A utilização do bambu beneficia directamente as populações dos países pobres ou em vias de desenvolvimento, onde cresce”,comenta Shyam Paudel, da INBAR.
Mas nem tudo é sorridente no mundo do bambu. Algumas espécies podem tornar-se incontroláveis e colonizar rapidamente grandes extensões de terreno. A palnta está também sujeita ao ataque do “lyctus”, um insecto xilófago, pelo que os produtos acabados devem ser em geral pré-tratados. Além disso, a transformação do bambu em laminados não é isenta de consequências ambientais, em especial se for descorado. Mais preocupante ainda é que não existe até ao momento, na Europa e nos Estados Unidos (à excepção do Havai), nenhuma plantação comercial de bambus de construção. A maior parte é proveniente da China, da Índia, do Vietname e da América Latina. A China teria, em 2005, 5,4 milhões de hectares de bambu, ou seja, 2,7 por cento das suas florestas. Todas as casas vendidas pelo Bamboo Techonolgies provêm do Vietname, sob a forma de “kits” de montagem. A necessidade de expedir bambu e produtos dele derivados para todo o mundo torna-o menos respeitador do ambiente do que se poderia pensar. “Como em relação a muitas matérias-primas o transporte é um problema”, confirma Sally Hall, da Association for Environment Conscious Building, uma organização britânica que trabalha na criação de um “patamar de ouro” para casas com “quase zero” emissões.
Mas para os amantes do bambu, as vantagens compensam amplamente os defeitos e divulgam a sua mensagem com um fervor religioso. É o caso da arquitecta Gale Goldberg “Façam o bambu entrar na vossa vida” exorta no livro Bamboo Style.”