Ecologia Urbana

Blog da disciplina de ecologia urbana, do 5º ano da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, docência do Professor Doutor Jacinto Rodrigues

27.3.07

Cal, artigo do Arq. Jorge Lira - dados históricos

A sua realização remonta à antiguidade (Vitrúvio, Sec. I aC, Livro II, Capt. V), sendo a Cal o ligante fundamental de todas as construções da antiguidade, designadamente das construções Romanas. A utilização de uma determinada quantidade de óleo no processo de hidratação da Cal produz uma espécie de betume, que ancestralmente se designava por galagala. Quando misturado este betume com areia e água, obtinha-se uma argamassa com excelentes qualidades para assentamento de alvenarias ou realização de rebocos. A fortaleza de Ormuz, cuja construção foi ordenada por Afonso de Albuquerque no Sec. XVI, é um exemplo da utilização corrente deste tipo de argamassa, em acréscimo, a partir de Cal obtida de conchas variadas sobretudo, de ostras, como ligante das pedras de arenito vermelho com que a fortaleza foi erigida. Os ventos fortes predominantes no local motivaram a erosão dos arenitos, permanecendo as juntas, actualmente, 400 anos depois, em relevo: pela dureza adquirida e extraordinária resistência da argamassa não foram erudidas pelo vento – caso típico em que a argamassa prevaleceu sobre a alvenaria. Fenómeno em tudo idêntico se pode verificar no anfiteatro Romano de Mérida (Emérita Augusta), salvo não ser conhecido que a Cal subjacente tenha, neste caso, sido hidratada com óleo – embora tudo leve a crer que sim. A diferença em relação a Ormuz, é que no caso de Mérida não estamos perante 400 anos, mas sim ... 2000 ! Em todo o caso, inúmeros estudos e exemplos demonstram a enorme durabilidade e dureza, além de salubridade, das argamassas de Cal Hidratada com Óleo, importando apenas registar que este tipo de Cal oferece as seguintes propriedades e características: 1. Enorme resistência e durabilidade 2. Grande plasticidade, sendo facilmente trabalháveis e aplicáveis em obra 3. Grande aderência às superfícies, não descolando facilmente durante a aplicação 4. Ausência de fissuras durante a secagem e endurecimento, ao contrário das argamassas de Cal normais 5. Permitem a respiração da construção, seja por aplicação no reboco, seja na junta da alvenaria. Este aspecto é fundamental, pois impede a condensação de humidade no interior das casas, tornando os interiores sãos. A cal purifica o ar, porque devido à sua composição química, absorve o dióxido de carbono durante o processo de carbonatação da Cal. De facto, a Cal empregue em construção encontra-se hidratada ou extinta, isto é, na forma Ca (OH)2. Quando é empregue em construção sob a forma de argamassa, o seu endurecimento resulta da absorção de dióxido de carbono para que a sua transformação em carbonato de cálcio ocorra. A este processo (de endurecimento) se dá o nome de Carbonatação: Ca (OH)2 + CO2 = CaCo3 + H2O Processo Químico em que: Ca (OH)2 + CO2 = CaCo3 + H2O Cal Hidratada Dióxido de Carbono Carbonato de Cálcio Água (que se evapora) 6. È hidrófuga, isto é, preserva a parede da humidade exterior, combatendo a formação de sais na alvenaria 7. É polivalente, pois tanto pode ser aplicada como argamassa de cal AÈREA (presa em contacto com o Ar) como numa argamassa de cal HIDRAULICA (presa em contacto com água ou ambiente húmido) 8. A Cal é um produto ECOLÒGICO porque a sua produção ou fabrico resulta de uma Calcinação a temperaturas de 600o C a 800 oC, que se obtém por queima de lenhas normais, e ao longo da sua vida, absorve CO2, contrariamente ao cimento, que seobtém a temperaturas não inferiores a 1450oC, o que implica a queima de combustíveis fósseis bem como uma enorme libertação de CO2 para a atmosfera (a produção de uma tonelada de cimento origina a libertação de cerca de uma tonelada e meia de CO2 para atmosfera!). 9. A nível estético, nada se compara à textura, cor, brilho de uma superfície rebocada e caiada a Cal, pois os micro cristais presentes na argamassa e na caiação, bem como a normal irregularidade do trabalho, permitem a luz ser reflectida com matizes suaves e subtis na mesma superfície do mesmo reboco, contrariamente à pintura com tintas industriais, em que a subtileza não existe. 10. A cal envelhece com dignidade, isto é, o seu processo de degradação é permanente e subtil, acontece por matizes, e se na realização do reboco, for desde logo incorporado o pigmento de cor da caiação final, o processo de envelhecimento é suave e virtualmente pode ocorrer de forma contínua ao longo de séculos sem que a edificação perca dignidade e aparência.